sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

OS CÍRCULOS DE CULTURA COMO METODOLOGIA PARA O PROJETO LUTHIERIA CULTURAL

     Iniciamos as atividades do Projeto Luthieria Cultural tendo como processo metodologico os Círculos de Cultura em Paulo Freire, nossas primeiras vivências partiram da reconstituição das Histórias de Luta e resistência dos participantes. Conversamos sobre as diversas realidades da comunidade Parque São Vicente no Canindezinho, os ponto de tensão como as situações de violência e os apontamentos que o jovens colocam como forma de superação destas questões. O Projeto Luthieria em Janeiro de 2013 dará inicio aos procesos de confecção de instrumentos percussivos como ALFAIAS, CAIXAS, SURDOS entre outros. Nossa proposta é refletir sobre o local que moramos, produzir conhecimento e expor as produções através da música, dos cortejos culturais, espetáculos e recitais.
 
Sobre os Círculos de Cultura......
 
 
 OS CÍRCULOS DE CULTURA COMO ESTRATÈGIAS DE PROBLEMATIZAÇÂO DA REALIDADEE E DE FORTALECIMENTO DO PROTAGONISMO POPULAR
Vera Lúcia de Azevedo Dantas
                                                                                     Ângela Maria Bessa Linhares
Sistematizados por Paulo Freire (1991) os Círculos de Cultura estão fundamentados em uma proposta pedagógica cujo caráter radicalmente democrático e libertador propõe uma aprendizagem integral, que rompe com a fragmentação e requer uma tomada de posição perante os problemas vivenciados em determinado contexto. Para Freire essa concepção promove a horizontalidade na relação educador-educando e a valorização das culturas locais, da oralidade, contrapondo-se em seu caráter humanístico, à visão elitista de educação.
Concebidos na década de 1960, como grupos compostos por trabalhadores populares, que se reuniam sob a coordenação de um educador, com o objetivo de debater assuntos temáticos, do interesse dos próprios trabalhadores, cabendo ao educador-coordenador tratar a temática trazida pelo grupo, surgem no âmbito das experiências de alfabetização de adultos no Rio Grande do Norte e Pernambuco e do Movimento de Cultura Popular.  Não tinham a alfabetização como objetivo central, mas a perspectiva de contribuir para que as pessoas assumissem sua dignidade como seres humanos e se percebessem detentores de sua história e de sua cultura, promovendo a ampliação do olhar sobre a realidade.
Nesse contexto, propõem uma práxis pedagógica que se compromete com a emancipação de homens e mulheres ressaltando a importância do aspecto metodológico, no fazer pedagógico, sem desvalorizar, no entanto, o conteúdo específico que mediatiza esta ação, possibilitando a tomada de consciência do educando mediante o diálogo e o desvelamento da realidade com suas interligações, culturais, sociais e político-econômicas.
Destarte, caracteriza-se como locus privilegiado de comunicação-discussão  embasadas no diálogo, nas experiências dos atores-sujeito, na produção teórica da educação e na escuta, a qual se orienta pelo desejo de cada um e cada uma aprenderem as falas do outro e da outra problematizando-a e problematizando-se.
Tendo como princípios metodológicos o respeito pelo educando, a conquista da autonomia e a dialogicidade, os círculos de cultura, tais como foram sistematizados por Freire, podem ser didaticamente estruturados em momentos tais como: a investigação do universo vocabular, do qual são extraídas palavras geradoras. Esse mergulho permite ao educador interagir no processo, ajudando-o a definir seu ponto de partida que se traduzirá no tema gerador geral, vinculado a ideia de interdisciplinaridade e subjacente à noção holística de promover a integração do conhecimento e a transformação social.
A Tematização, ou seja, processo no qual os temas e palavras geradoras são codificados e decodificados buscando a consciência do vivido, o seu significado social, possibilitando a ampliação do conhecimento e a compreensão dos educandos sobre a própria realidade, na perspectiva de intervir criticamente sobre ela. O importante não é transmitir conteúdos específicos, mas despertar uma nova forma de relação com a experiência vivida.
A Problematização representa um momento decisivo da proposta e busca superar a visão ingênua por uma perspectiva crítica, capaz de transformar o contexto vivido.  A ação de problematizar em Paulo Freire impõe ênfase no sujeito práxico que discute os problemas surgidos da observação da realidade com todas as suas contradições, buscando explicações que o ajudem a transformá-la. O sujeito, por sua vez, também se transforma na ação de problematizar e passa a detectar novos problemas na sua realidade e assim sucessivamente. Nesse sentido, a problematização emerge como momento pedagógico, como práxis social, como manifestação de um mundo refletido com o conjunto dos atores, possibilitando a formulação de conhecimentos com base na vivência de experiências significativas.
Assim, o diálogo se constitui como elemento-chave no qual educadores e educandos sejam sujeitos atuantes. Para Freire (2003), o diálogo possibilita a ampliação da consciência crítica sobre a realidade ao trabalhar a horizontalidade, a igualdade em que todos procuram pensar e agir criticamente com suporte na linguagem comum, captada no próprio meio onde vai ser executada a ação pedagógica e que exprime um pensamento baseado em uma realidade concreta. Diálogo, nessa perspectiva, tem a amorosidade como dimensão fundante, contrapondo-se a ideia de opressão e dominação. Situa a humildade como princípio no qual o educador e o educando se percebem sujeitos aprendentes, inacabados, porém jamais ignorantes.
A ampliação do olhar sobre a realidade com amparo na ação-reflexão-ação e o desenvolvimento de uma consciência crítica que surge da problematização permite que homens e mulheres se percebam sujeitos históricos, o que implica a esperança de que nesse encontro pedagógico sejam vislumbradas formas de pensar um mundo melhor para todos. Esse processo supõe a paciência histórica de amadurecer com o grupo, de modo que a reflexão e a ação sejam realmente sínteses elaboradas com ele.
A democracia (...) é forma de vida, se caracteriza, sobretudo por forte dose de transitividade de consciência no comportamento do homem. Transitividade que não nasce e nem se desenvolve a não ser dentro de certas condições em que o homem seja lançado ao debate, ao exame de seus problemas comuns. .(FREIRE, 1991, p. 80).
Dessa forma, Paulo Freire fala de educação como conscientização, reflexão rigorosa sobre a realidade em que se vive, com o entrelaçamento das linguagens e suas respectivas lógicas epistêmicas, evidenciando os focos a serem problematizados pelo grupo, instigando o debate e constituindo uma rede de significados.
Nesse contexto, segundo Dantas (2010), o Círculo de Cultura constitui-se locus da vivência democrática, de formas de pensamentos, experiências, linguagens e de vida, que possibilita o estabelecimento de condições efetivas para a democracia de expressões, de pensamentos e de lógicas com base no respeito às diferenças e no incentivo à participação em uma dinâmica que lança o sujeito ao debate, focando os problemas comuns.
REFERÊNCIAS
·        DANTAS, V.L.A. Dialogismo e arte na gestão em saúde: a perspectiva popular nas Cirandas da Vida em Fortaleza. 2010. (Tese de Doutorado). Universidade Federal do Ceará, Fortaleza,CE, 2010.
·        FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. 20. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
·        ________________O caminho se faz caminhando: conversas sobre educação e mudança social. 2a Ed. Vozes, Petrópolis, RJ 2003.
 


[1] Relação das palavras de uso corrente, entendida como representativa dos modos de vida dos grupos ou do território onde se trabalhará (estudo da realidade). Este momento permite o contato mais aproximado com a linguagem, as singularidades nas formas de falar do povo, e suas experiências de vida no local.
[2] Unidade básica de orientação dos debates.
[3] A codificação pode se dar por imagens expressas de várias formas desenho, fotografia, imagem viva, que por sua vez deverão suscitar novos debates. Parte-se da compreensão de que cada pessoa, cada grupo envolvido na ação pedagógica, dispõe em si próprio, ainda que de forma rudimentar, dos conteúdos necessários dos quais se parte.

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